Frei Betto, 72, é inquestionavelmente um homem de esquerda. Participou da fundação da CUT, serviu de assessor especial ao amigo Lula em seus primeiros anos na Presidência e dá assessoria a movimentos sociais como MST.
Nem por isso passa a mão na cabeça do campo progressista. Para ele, a autocrítica "se faz urgente" após uma sucessão de erros em governos petistas. "Agarramos o violino com a mão esquerda e tocamos com a direita..."
Detrator de Michel Temer, "que perdeu todas as condições de governabilidade", e defensor de uma nova Diretas-Já, o frade dominicano é pessimista com o quadro atual. "Voltamos à era do messianismo político, a mesma que gerou Hitler e Mussolini", diz à reportagem por e-mail.
RENÚNCIA DE TEMER
Apesar da resistência inicial do presidente Michel Temer, o frei acredita ser "questão de dias" até ele sucumbir à renúncia. "Perdeu todas as condições de governabilidade. A melhor saída é eleição direta já. A democracia não pode temer o voto popular."
BOICOTE À 'INDIRETA-JÁ'
Defensor do voto popular já para 2017, caso Temer caia, ele prefere que a esquerda fique de fora de uma eleição indireta. "Não falo senão em meu nome. Em caso de eleição indireta o mais correto é boicotar. Este Congresso é legal, porém ilegítimo, pelo volume de maracutaias nas quais se encontra atolado", afirma. FHC, Tasso Jereissati, Rodrigo Maia, Nelson Jobim, Cármen Lúcia... Nenhum dos nomes postos para eventual escolha via deputados e senadores o agrada. "O campo progressista não aceita eleição indireta. O futuro presidente teria a cara do atual Congresso."
AUTOCRÍTICA-JÁ
Entre os esquerdistas, frei Betto foi voz solitária ao apontar como o PT, uma vez no poder, reproduziu políticas de governos anteriores. Em 2015, chegou a dizer que a situação política sob Dilma Rousseff estava "mais complicada que cachorro solto em fábrica de salsichas". Para ele, falta autocrítica no campo, "e ela se faz urgente". "Cometemos muitos erros. Agarramos o violino com a mão esquerda e tocamos com a direita..." Acredita que sairão fortalecidos da crise "os partidos e os políticos éticos, mais a nação brasileira, que aplaude a severa punição aos corruptos". Reconhece o risco de conservadores ganharem protagonismo. "O risco existe. Mas espero que os progressistas percam em espaço e ganhem em coerência. Como dizia Darcy Ribeiro "perdi todas, mas jamais gostaria de estar do lado de quem me venceu".
LULA LÁ?
Frei Betto diz não ver futuro para o PT se o partido seguir com a "ideia fixa de ganhar a próxima eleição". Seja Diretas-Já ou 2018, diz que Lula, velho amigo para o qual serviu de assessor especial no início do primeiro mandato, "tem pleno direito de concorrer". Mas ressalva: "O PT precisa voltar a ter um projeto de Brasil, e não apenas de poder". Para unificar a oposição, "há que se buscar unidade em torno de um programa, não de um suposto salvador da pátria".
CIRO GOMES
Correntes progressistas defendem o pré-candidato do PDT à Presidência como um nome possível para a trupe progressista retomar o Palácio do Planalto. O frei, contudo, não o vê como "de esquerda". "Seu projeto de poder é pessoal, é o que percebo até agora", afirma.
SERGIO MORO
O escritor percebe perseguição contra o amigo Lula da parte do juiz responsável pela Lava Jato. Acha que faltaram "provas das acusações" contra o petista no primeiro cara a cara entre ele e o magistrado, em Curitiba. "E quem acusa tem o ônus da prova." Para ele, "Moro se empenha em tentar tirar Lula da vida política".
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